domingo, junho 08, 2025

Poesia ao domingo

 Não assinalei os 500 anos do seu nascimento, mas ainda vou a tempo.

Deixo-vos com três das oitavas que Luís de Camões dedicou a D. António de Noronha sobre o desconcerto do mundo.


  Quem pode ser no mundo tão quieto,

ou quem terá tão livre o pensamento,

quem tão exprimentado e tão discreto,

tão fora, enfim, de humano entendimento

que, ou com público efeito, ou com secreto,

não lhe revolva o espanto e sentimento,

deixando-lhe o juízo quási incerto,

ver e notar do mundo o desconcerto?


  Quem há que veja aquele que vivia

de latrocínios, mortes e adultérios,

que aos juízos das gentes merecia

perpétua pena, imensos vitupérios,

se a Fortuna em contrário o leva e guia,

mostrando, enfim, que tudo são mistérios,

em alteza d´estados triunfante,

que, por livre que seja, não se espante?


  Quem há que veja aquele que tão clara 

 teve a vida que em tudo por perfeito

o próprio Momo às gentes o julgara,

ainda que lhe vira aberto o peito,

se a má Fortuna, ao bem sòmente avara,

o reprime e lhe nega seu direito,

que lhe não fique o peito congelado, 

por mais e mais que seja exprimentado?




Retirei estas oitavas de "Luís de Camões, Rimas" com texto estabelecido e prefaciado por Álvaro Júlio da Costa Pimpão.

Foi por esta obra que estudei Camões na faculdade e daí encontrar-se cheia de anotações.


Se  o Poeta já sentia o mundo em desacordo com a justiça, 500 anos depois estamos de mal a pior.

É um desconcerto total!

13 comentários:

  1. A imortalidade do Poeta reflecte-se na beleza dos seus versos.

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  2. Gostei, nota dez! (o máximo)
    Abraço

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  3. Em que época da história da humanidade nāo houve desconcerto?

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    1. Tens toda a razão, mas atualmente o mundo está a raiar a loucura!

      Abraço

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  4. Aplauso , sempre, para Luiz Vaz!

    Nada se aprendeu nestes cinco séculos, infelizmente.

    Abraço, bom domingo.

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  5. Desconcertados ficamos todos nós, viventes do século XXI, quando vemos que por muitos que sejam os Regimes Governamentais, desde a Realeza, Ditadura e Democracia, tudo em Portugal e no mundo, continua sem conserto... Que tristeza!

    Abraços.

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    1. Realmente o caos e a injustiça reinam em todos os regimes!

      Abraço

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  6. Viva, Rosa dos Ventos!
    Também eu dediquei a minha publicação de hoje a Camões, não indo buscar poemas de sua autoria, mas oferecendo-lhe um soneto a que dei o nome de "romã"

    Espero que a romã adoce um pouco este desconcerto do mundo que, infelizmente, está mais actual do que nunca.

    Um abraço!

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    1. Vou então "saborear" a romã!
      O desconcerto do mundo atingiu um nível tão elevado que não sei onde irá parar.

      Abraço

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  7. Desculpe, Maria João, mas só encontrei o seu blogue datado de 2014.

    Abraço

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