Estou à janela ao lado da minha avó paterna, empoleirada numa cadeira. Tenho 4/5 anos, trajo um vestido creme de manga curta, gola redonda bordada a castanho (cujo motivo se repete em baixo, na bainha - lembro-me bem), na cabeça destaca-se um enorme laçarote branco com o qual a minha mãe pretendia disciplinar o meu cabelito rebelde. A minha avó veste de escuro, (nunca a vi com cores garridas ou claras), os nossos cotovelos tocam-se no parapeito e repousam sobre uma colcha estendida a varrer o chão. Sorrimos.
Do lado de fora, sem taparem a colcha, estão duas primas mais velhas, umas senhorinhas já e duas tias, irmãs do meu pai, únicas raparigas num rancho de nove filhos.
Pelo vestuário de verão de todas as figurantes e pela colcha, estamos à espera que passe a procissão da festa da Padroeira da freguesia, Nossa Senhora da Assunção, que se realiza a 15 de Agosto.
O momento ficou registado a preto e branco numa daquelas películas com um picotado na margem e uma larga moldura branca que reduzia bastante o tamanho da imagem.
Faço esta descrição de cor porque não encontro a fotografia, desconfio mesmo que deve ter desaparecido no incêndio que devorou parte da tal casa que foi feita para eu não morar nela.
É esta a janela.
Agora está assim, já ninguém a abre há muito!
Do lado de fora, sem taparem a colcha, estão duas primas mais velhas, umas senhorinhas já e duas tias, irmãs do meu pai, únicas raparigas num rancho de nove filhos.
Pelo vestuário de verão de todas as figurantes e pela colcha, estamos à espera que passe a procissão da festa da Padroeira da freguesia, Nossa Senhora da Assunção, que se realiza a 15 de Agosto.
O momento ficou registado a preto e branco numa daquelas películas com um picotado na margem e uma larga moldura branca que reduzia bastante o tamanho da imagem.
Faço esta descrição de cor porque não encontro a fotografia, desconfio mesmo que deve ter desaparecido no incêndio que devorou parte da tal casa que foi feita para eu não morar nela.
É esta a janela.
Agora está assim, já ninguém a abre há muito!
É impressionante a tua descrição, e depois olhar a janela fechada...
ResponderEliminarExcelente momento.
Beijinho*
saudades
ResponderEliminarjocas maradas
Adorei.
ResponderEliminar(Fez-me regressar a uma infância que não foi minha, mas que vivi através de livros e outras coisas que tais).
Escreve mais. Abre as janelas que dás como fechadas.
"(...) da tal casa que foi feita para eu não morar nela". Adorei mesmo.
Um texto perfeito, numa narrativa simples,capaz de nos conduzir pelos caminhos recônditos de nós mesmos.
ResponderEliminarUm abraço, obrigada por esta janela que aqui deixaste aberta à leitura.
Mel
www.noitedemel.blogs.sapo.pt
muito bonito o post...parabéns! ***
ResponderEliminarA tua linda descrição parece a de um filme italiano. Deliciosa. E como se consegue fazer render tanto uma simples foto em preto e branco? Há que ter talento e coração e engenho na empreitada. Quanto ao picotado branco na margem das fotos levou-me pra longe, pra junto de uma menina de cabelinho liso e franjinha... sem laçarote, mas vestidinho muito semelhante. Beijos, Senhora das janelas... que os ventos atravessaram e ainda hão de...
ResponderEliminarÉ bom acordar e dar de chofre com textos com esta qualidade. Gostei muito Leo, fez-me lembrar a janela da minha avó Ana. Lembro-me dela, à janela, no fim da sua longa vida. Nas férias, quando chegava a Minde, ia ter com ela. Invariavelmente encontrava-a à janela, talvez na vã tentativa de não deixar que o Mundo lhe fugisse.
ResponderEliminarEra vulgar dizer-me, quando eu, ainda adolescente, me abeirava dela.
Dizia amiude: Ai Vítor, o que é de triste a velhice!
E eu, às vezes, depois de a cumprimentar, chorava.
Não gosto da velhice... aquela frase martela-me o espírito muitas vezes.
Eu gostava muito de si, avó Ana. Lembro-me muito da sua janela.
Vítor
Não me lembro dessa foto... mas um texto assim vale bem por uma imagem!
ResponderEliminarMelhor que a janela só a tua excelente prosa de memória...
ResponderEliminarCom a tua descrição perfeita, conseguiste colocar todas as pessoas nos seus devidos lugares.
Até conseguimos ver a procissão a passar...
A descrição é melhor do que uma fotografia, pois os detalhes são mais nítidos e quase paupáveis.
ResponderEliminarBeijos de Sol e de Lua.
Para todos os que gostaram da janela da minha avó um abraço amigo e o desejo de um bom fim de semana!
ResponderEliminarUm abraço especial para a Bruxinhachellot que do outro lado de ..."tanto mar"...me visitou pela primeira vez!
ResponderEliminarGostei muito da descrição e espero que a fotografia não tenha ardido e venha ser reencontrada.
ResponderEliminarAi Ai!!!(suspiro de nostalgia)
ResponderEliminarAmiga, espero que encontres a fotografia da tua infância.Até os olhos brilham quando as contemplamos! um beijinho.
ResponderEliminarEstas fotos antigas, de papel recortadinho, são sempre fabulosas.
ResponderEliminar*
Bela memória, em todos os sentidos!
ResponderEliminarRecordações de memórias perdidas,em que apenas que ficou um pequeno registo.
ResponderEliminarBjs Zita
Nunca mais é dia de mudar o post! :( Tás muito econômica em acções. Deve ser o calor do verão. Bjs!
ResponderEliminarAbre a janela, os dias estão bonitos. É só preciso deixares entrar o sol, para ficares rosadinha...
ResponderEliminar:)
Beijinho
boa noite...
ResponderEliminarno seu post FERIADO MUNICIPAL nos comentários 20 e 21 talvez haja algo que a fosse alegrar!!!!se assim desejar comentar muito me orgulharia se entender .
LP
Caro anónimo
ResponderEliminarProcurei o tal CD na loja do novo maestro e ninguém me conseguiu dizer onde encontrá-lo.
Disseram até que era uma gravação particular...
Excelente.
ResponderEliminarDiscretamente venho lendo o que escreves. Nem sempre comento.
Gostei de ver a tua fotografia perdida. Até consegui escutar nela o som das cigarras nesse quente dia de Agosto.
Quanto à casa, algumas foram feitas para não morarmos nelas…
Um beijo.