Quando era miúda, o acesso a guloseimas e a sua ingestão não era para todos os dias.
Em todo o caso havia línguas de gato, beijinhos com um salpico de açúcar colorido em cima, bolacha Maria e rebuçados daqueles que vinham embrulhados em papel bem difícil de descolar e também embrulhados em cromos de jogadores que colávamos em cadernetas, por equipas, algumas das quais já nem existem. Lembram-se de o Lusitano de Évora jogar na 1ª Divisão?
Ah! E ainda chocolates, mas esses só mesmo no Natal e no sapatinho...
Todo este material altamente tentador, era comprado com peso, conta e medida e com dinheiro amealhado a muito custo nas mercearias, da então aldeia - no "Ti Lias", na "Ti Jaquina" Moreira e na "Ti Bitriz", desaparecidas há muitos anos.
Entrava lá e mal chegava ao topo dos balcões de madeira que me pareciam enormes, por detrás do espaço onde "manobrava" o lojista, havia armários envidraçados onde estavam acondicionados em frascos os produtos mais "exóticos" e por baixo tulhas com tampa, com os restantes géneros alimentícios. Em alguns casos ainda havia um espaço entre as vidraças e as tulhas com tecidos, riscados, chitas, "popelines" e, dentro de caixas, colchetes, agulhas, botões, elástico, linhas e afins.
Tudo se comprava ao litro, ao quilo, à dúzia, a metro, à unidade e nada estava previamente empacotado.
Empacotadas chegavam num ritual festivo pascal as amêndoas que o meu pai trazia de Lisboa, em sábado de Aleluia.
Mas não vinham num pacote qualquer!
Eram daqueles pacotes de papel grosso por dentro, como os demais, mas forrados por fora com um outro belíssimo, fino, decorado com florinhas a lembrar a Primavera.
E eram sempre dois pacotes, um com amêndoas torradas e o outro com as lisinhas e coloridas.
A minha irmã e eu aguardávamos ansiosamente a chegada do Pai.
E já nem sei o que nos trazia mais brilho ao olhar, se a antecipação da doçura das amêndoas, se a visão dois belos pacotes onde elas vinham primorosamente escondidas, que até dava pena abri-los...
Que saudades eu tenho do tempo em que não sabia que era feliz!